Após uma noite de sono, você costuma lembrar ou esquecer do que aconteceu nos dias anteriores? Segundo uma pesquisa do Instituto do Cérebro (ICe) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), publicada na PLoS Computational Biology, as duas situações são possíveis, pois o sonho ajuda a esquecer, a fortalecer e também a transformar as memórias.
Duas correntes teóricas disputam a explicação desses fenômenos – uma fala sobre a importância do sono para o estabelecimento das memórias de longo prazo e a outra diz que esquecemos de experiências enquanto dormimos. O novo estudo da UFRN conciliou as duas teorias, mostrando que ambas podem ocorrer simultaneamente. Para isso, foram utilizadas moléculas para investigar marcadores bioquímicos da formação de memórias, além de técnicas eletrofisiológicas – observando as propriedades elétricas de neurônios – e a modelagem computacional de redes neurais artificiais.
Segundo o pesquisador do Instituto do Cérebro (ICe), Sidarta Ribeiro, o primeiro passo foi observar o cérebro animal após o sono REM (sono em que sonhamos). Foi constatado que, quando o adquirimos uma memória, acontece no cérebro a ativação de “cascatas bioquímicas”. “Uma proteína vai transmitindo uma mensagem a outra até chegar ao núcleo da célula e promover mudança na expressão dos genes. É neste momento que algumas lembranças se consolidam e outras não”, esclarece.
Essa etapa inicial procurou medir os níveis de uma proteína fosforilada, a qual está relacionada com potencialização das memórias de longo prazo, durante o ciclo de sono e vigília de ratos. A partir da observação do hipocampo (local do cérebro ligado às memórias) do roedor, observou-se que a LTP (sigla em inglês para a potencialização de longo prazo) ocorre no início do sono REM.
Na segunda fase, com a modulagem computacional, foram construídos modelos de plasticidade das sinapses (capacidade de rearranjos dos neurônios), alimentados com ativações elétricas do cérebro de roedores registrados através do ciclo de sono e vigília. Os pesquisadores observaram que a LTP, durante o sono, tanto fortaleceu como reorganizou as conexões neurais, levando a mudanças significativas do padrão global das memórias.
Descobriram ainda que, por meio da interação dos mecanismos previstos pelas duas teorias concorrentes, o cérebro é capaz de controlar de forma mais eficiente quais memórias são mantidas nas suas conexões.
Os resultados permitem dar um passo à frente na compreensão do papel cognitivo do sono, ao indicar que as duas correntes teóricas não são excludentes. Ao invés disso, cada uma constitui uma etapa importante no processo de consolidação da memória, apresentando impacto na aprendizagem, na lembrança seletiva e na criatividade.
A pesquisa orientada por Sidarta Ribeiro e Adrião Duarte Dória Neto foi realizada por Wilfredo Blanco, Cátia Mendes Pereira, Vinicius Rosa Cota, Annie Costa Souza, César Rennó-Costa, Adriano Tort, entre outros autores.
Williane Silva/AGECOM-UFRN
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