Depois de Erasmo Carlos, o ex-jogador de futebol Pelé (Edson Arantes do Nascimento) também foi internado com síndrome edemigênica, uma condição em que há excesso de líquidos (edema) nos tecidos.
Para explicar um pouco soube a doença, conversamos com a Dra. Caroline Reigada, médica nefrologista, especialista em Medicina Interna pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo e em Nefrologia pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
O que é sindrome edemigênica e como ela se inicia?
Dra. Caroline Reigada: É um conjunto de sinais e sintomas caracterizado pelo excesso de líquido no corpo (edema), que pode ter origem em três principais órgãos: rim, coração e fígado. Quando o rim não funciona adequadamente como barreira para a perda de proteínas na urina, o corpo fica mais edemaciado (inchado), pois ocorre um desequilíbrio de pressões entre o vaso sanguíneo e o interstício (que é a região externa ao vaso sanguíneo). Isso faz com que o líquido extravase para fora do vaso, acumulando-se nos tecidos da pele e do subcutâneo. É o famoso edema, que pode acometer até o rosto.
Já o fígado é responsável pela produção das proteínas do corpo. Lembrando que essas mesmas proteínas, quando estão no sangue, são responsáveis por ” segurar” a água dentro do vaso sanguíneo. Se o fígado está doente (por exemplo, na cirrose), pode haver extravasamento de líquidos e consequente edema.
O coração é o nosso órgão de bomba, ou seja, realiza uma força ejetora para levar sangue a todo o organismo. Quando ele está fraco (como é o caso da insuficiência cardíaca), mais sangue (e portanto, mais líquido) fica represado nas veias e no pulmão, o que pode levar ao edema do pulmão (“água no pulmão”) e edema periférico (das pernas, da barriga e do fígado). Outras causas são: alergias e problemas circulatórios. No caso da insuficiência venosa ou linfática, o edema geralmente fica circunscrito apenas aos membros inferiores.
É um problema raro ou de alta incidência?
Dra. Caroline Reigada: Considerando que esta síndrome pode advir de várias doenças, não é um problema raro. Por exemplo: a insuficiência cardíaca é uma das principais causas de mortalidade e morbidade no mundo. No Brasil, a sua prevalência é de aproximadamente 2 milhões de pacientes e sua incidência é de aproximadamente 240.000 novos casos por ano. A cirrose hepática e outras hepatites crônicas foram a décima maior causa de morte no país no ano de 2017, de acordo com o Ministério da Saúde. Considerando a doença renal crônica, que pode ser a causa de uma síndrome edemigêmica, sabemos que ela causa pelo menos 2,4 milhões de mortes por ano, com uma taxa crescente de mortalidade. No Brasil, a estimativa é de que mais de dez milhões de pessoas tenham a doença.
Que tipo de paciente é mais suscetível ao problema?
Dra. Caroline Reigada: Pacientes que tenham risco de desenvolver doenças do coração, do fígado e do rim são os mais propensos a apresentar a síndrome edemigêmica. Portanto, são estes os maiores suscetíveis: idosos, diabéticos, hipertensos, obesos, portadores de dislipidemia, tabagistas, etilistas e portadores de doenças autoimunes. A intoxicação por medicações levando a uma hepatite fulminante também pode ser a causa de uma síndrome edemigêmica. O uso de anti-inflamatórios de forma exagerada é outra causa desta condição, pois acarreta na inflamação renal e, portanto, no surgimento do edema generalizado.
De que forma ela pode levar à morte?
Dra. Caroline Reigada: A sobrecarga de líquidos ao coração e ao pulmão, principalmente, podem ser fatais. Existem casos em que há também edema cerebral, condição grave e potencialmente fatal. O edema agudo de pulmão (água no pulmão) pode levar à insuficiência respiratória e morte. Além disso, a síndrome edemigêmica facilita a infecção dos tecidos que ficam edemaciados. O tecido celular subcutâneo, a gordura abaixo da pele, pode então se infectar, o que chamamos de paniculite, que pode evoluir para uma infecção generalizada.
Ela pode causar trombose?
Dra. Caroline Reigada: Quando muito líquido extravasa para fora do vaso sanguíneo, o sangue que permanece dentro do vaso fica mais espesso e, portanto, há um aumento do risco de trombose.
Qual o tratamento indicado?
Dra. Caroline Reigada: O tratamento reúne o alívio do edema, que consiste usualmente na utilização de diuréticos e, principalmente, focar na causa da síndrome. Doenças imunes são tratadas com imunossupressores. A forma grave de doença renal crônica ou da lesão renal aguda podem necessitar de diálise. A insuficiência cardíaca apresenta todo um arsenal terapêutico para o seu controle. Doenças avançadas ou graves do rim, do coração e do fígado podem exigir um transplante.
Devemos ter em mente que os casos importantes de edema, com falta de ar e cansaço precisam de apoio do médico na emergência hospitalar. Não é adequado o paciente tomar diuréticos por conta, pois, além de não haver o reconhecimento da verdadeira causa do problema, existem muitos efeitos colaterais relacionados aos diuréticos.
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