O governo federal estuda uma MP (medida provisória) para permitir a contratação de empréstimos consignados por beneficiários do Auxílio Brasil e do BPC (Benefício de Prestação Continuada).
Estimativas das pastas envolvidas indicam que a alteração poderia irrigar as famílias do Auxílio Brasil com até R$ 30 bilhões em financiamentos. No caso do público do BPC, o potencial é calculado em R$ 19 bilhões.
Técnicos buscam fechar texto para que a proposta seja anunciada junto do pacote de medidas que deve ser apresentado ainda nesta quinta-feira (17) no Palácio do Planalto.
O anúncio também deve incluir a antecipação do 13º de aposentados e pensionistas do INSS para abril e maio e o lançamento de um programa de microcrédito.
A MP também deve ampliar o limite do salário ou benefício que pode ser empenhado na prestação de uma operação consignada, de 35% para 40%.
No ano em que buscará a reeleição, o presidente Jair Bolsonaro busca medidas que resultem em certo alívio no bolso dos eleitores no momento em que a inflação elevada tem restringido o poder de compra dos brasileiros.
Aliados do presidente dizem que sua recondução está diretamente ligada a uma melhora no cenário econômico e na qualidade de vida das pessoas.
O ministro da Cidadania, João Roma, disse à Folha que o crédito consignado seria um instrumento para dar acesso a crédito mais barato a quase 23 milhões de famílias contempladas pelos dois programas sociais.
Entidades de defesa do consumidor e especialistas, por sua vez, criticam a iniciativa por abrir a porteira para maior endividamento de uma parcela da população que já depende de transferências do governo para arcar com suas despesas básicas.
O BPC paga um salário mínimo (R$ 1.212) a idosos com mais de 65 anos e pessoas com deficiência que vivam em situação de baixa renda. Já o Auxílio Brasil repassa hoje ao menos R$ 400 por família, graças a um aumento temporário até dezembro de 2022. Antes, o benefício médio era de R$ 224.
Hoje, apenas aposentados e pensionistas do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), servidores públicos e assalariados do setor privado têm acesso ao crédito consignado, que oferece taxas de juros mais baixas por ter a garantia de que o valor da prestação será descontado diretamente da folha de pagamento —o que reduz risco de inadimplência.
Nas modalidades de crédito pessoal, sem garantia, o juro é mais elevado, mesmo que o tomador já seja cliente da instituição financeira.
No caso de famílias de baixa renda, público-alvo do Auxílio Brasil e do BPC, muitas sequer têm acesso a linhas de crédito. Os bancos evitam dar empréstimos a essas pessoas devido ao maior risco de não pagamento.
“Eu que sou deputado federal [licenciado], o banco analisa que eu tenho um salário até dezembro, eu posso pagar um consignado a 1,5% ao mês. Já uma pessoa que está no Auxílio Brasil, se quiser R$ 50 vai pagar 10% ao mês na mão de um agiota, porque ele não vai ter o setor bancário“, disse Roma.
O ministro da Cidadania afirmou também que as famílias de baixa renda já estão endividadas, e a autorização para o consignado pode ajudá-las a reorganizar o orçamento doméstico sem um peso tão grande de juros.
Roma citou que, segundo pesquisa da CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo), 26% dos R$ 84 bilhões previstos no Auxílio Brasil serão usados pelas famílias para quitar dívidas já existentes.
“A população está endividada e precisa ter acesso a dinheiro com juro mais barato“, disse o ministro. “Quando a gente joga a consignação, cai o risco bancário. E aí o cidadão pode pegar dinheiro mais barato, porque a gente está dando a garantia que vai descontar na folha.”
Segundo Roma, há hoje uma “pirâmide invertida” no Brasil. “O rico consegue acesso bancário e juro barato, e o pobre paga muito mais“, disse ele, rebatendo críticas de que a medida acabaria beneficiando os bancos. “Essa é a medida que leva justamente essa proteção e segurança jurídica para o pobre.”
O governo já tentou, no ano passado, autorizar a concessão de crédito consignado tendo o Auxílio Brasil como garantia. O beneficiário poderia empenhar até 30% do valor do benefício com a prestação do financiamento.
A mudança foi incluída na MP que criou o benefício social no lugar do Bolsa Família, mas acabou sendo excluída do texto durante a tramitação no Congresso Nacional.
O Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) é crítico da liberação dos consignados para beneficiários do programa social. A entidade afirmou, à época da tramitação da proposta, que a medida se tornaria uma armadilha para os consumidores mais vulneráveis e geraria “mais empobrecimento da população”.
Na época da tramitação, parlamentares de oposição também se colocaram contra a proposta.
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