O historiador Marcos Napolitano, professor da USP, pesquisador da Fapesp e especialista em história da república brasileira, com foco no período militar, fez uma análise contundente sobre a tentativa de golpe de Estado em 2022. Para ele, “Os fatos foram muito graves e não ficaram apenas no plano dos discursos e do tensionamento político contra a democracia, mas apostaram e trabalharam pelo caos social e pela volta da ditadura”.
Napolitano destaca o papel do Supremo Tribunal Federal (STF) e da Polícia Federal (PF) na investigação, afirmando que “o que já é um avanço”. O historiador ressalta a necessidade de aguardar a decisão da Procuradoria Geral da República (PGR) sobre a abertura de inquérito para apurar as responsabilidades dos envolvidos.
Segundo Napolitano, a tentativa de golpe fracassou por dois motivos principais. O primeiro foi o maior consenso em torno dos valores liberal-democráticos dentro das instituições políticas e jurídicas, em comparação com o passado. O segundo, e mais importante, foi a falta de apoio institucional e de organização. Ele destaca a ausência de apoio de setores liberais e da classe média, em contraste com o ocorrido em 2016, quando a presidenta Dilma Rousseff foi afastada. “Os golpistas de 2022 tinham até um razoável apoio na sociedade, mas sem apoio institucional nas Forças Armadas, nos grupos políticos organizados (partidos, associações civis), na imprensa e no parlamento, golpes dificilmente prosperam. Mas isso não diminui a gravidade do crime cometido contra a democracia por lideranças civis e militares entre 2022 e início de 2023”, explicou.
O pesquisador traça um paralelo entre a tentativa de golpe de 2022 e a crise política de 2015 e 2016, e o período do Lava Jato, afirmando que a tentativa de golpe é “um filho, ainda que indesejado, da crise política de 2015 e 2016 e do lavajatismo”. Ele analisa que as lideranças e simpatizantes da extrema direita se sentiram encorajados pelo golpe parlamentar de 2016, “que foi basicamente um golpe parlamentar com apoio social e jurídico”, mas que “ficaram com a sensação de que aquele trabalho não foi bem feito, posto que Lula ainda podia voltar ao poder pela vida eleitoral”.
Napolitano lembra que houve diversos golpes de Estado entre 1950 e 1964, alguns deles “muito estapafúrdios e tresloucados”, e que “De tanto errar os golpistas aprenderam e se organizaram melhor para 1964”. Por isso, ele alerta para a necessidade de “ficar alerta, punir tentativas de golpes e não ficar no discurso otimista de que ‘nossas instituições são fortes’ ou ‘a sociedade não aceita mais golpes de Estado’”.
Para fortalecer a democracia brasileira e prevenir novas tentativas de golpe, Napolitano propõe algumas medidas: um reforço na crença na democracia e nas formas negociadas de resolução de conflitos; a necessidade de que as elites políticas, independentemente da ideologia, isolem aventureiros e golpistas; e, finalmente, a punição exemplar dos golpistas, civis e militares, dentro dos marcos da lei. Ele reconhece a dificuldade da tarefa, considerando a desigualdade social, a violência e a cultura política autoritária do país.
Em suas considerações finais, Napolitano enfatiza a importância de que “as elites políticas de todas as ideologias saibam isolar aventureiros e golpistas que surgem de quando em quando dentro do próprio sistema político e que tenham seriedade para administrar o país de maneira minimamente decente e republicana”. E conclui: “E, por fim, punir os golpistas civis e militares de maneira exemplar e dentro dos marcos da lei”.
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