Casquinha do McDonald’s pode voltar a ser chamada de sorvete após Reforma Tributária

Através de inúmeros regimes de pagamentos de impostos, o sistema da reforma tributária usada até agora no Brasil levou diversas empresas a buscarem brechas na legislação para mudar a classificação de produtos e, assim, pagar menos impostos. Recentemente, esse foi o caso da famosa casquinha do McDonald’s e dos outros sorvetes servidos nas lanchonetes da rede, que passaram a ser classificados como sobremesa láctea.

A empresa de Tecnologia Especializada em Eficiência Tributária (Becomex) apontou que essa simples mudança técnica significou para a empresa uma redução de 38,97% para 11,78% nos impostos que incidem sobre o produto, mas agora não será mais necessária. Com a implementação do novo sistema, a tendência é que as discussões sobre classificação tributária desse tipo diminuam.

Consultada pelo N10, a Tax Manager na Becomex, Giovana Maria Frey Guardia, explicou que hoje todos os produtos recebem uma classificação fiscal, que é baseada no Sistema Harmonizado e Designação e de Codificação de Mercadorias (SH), que segrega os produtos com base em suas características, composição, destinação e níveis de participação humana na criação. Esse sistema é base para a NCM (Nomenclatura Comum do Mercosul). Utilizada no bloco econômico para questões relacionadas ao comércio exterior e é base, também, para a Tabela de Incidência do IPI (TIPI).

“Assim, conforme a NCM dada ao produto se define quais serão as alíquotas aplicáveis de IPI, bem como exceções relacionadas aos demais tributos federais e estaduais (PIS, Cofins, Imposto de Importação e ICMS)”, afirma Guardia. Através da aprovação da Reforma Tributária e o fim do IPI é de se esperar que discussões relacionadas as classificações fiscais diminuam. Entretanto, não cessarão, tendo em vista que as exceções previstas ao IBS e CBS, como por exemplo, Itens da cesta básica, medicamentos e higiene pessoal; bem como produtos que estejam no campo de incidência do Imposto Seletivo, como por exemplo, granadas de efeito moral (em que se discute se são artigos de pirotecnia, com alíquotas menos gravosas ou bombas e granadas), possivelmente serão elencadas na Lei Complementar com base na NCM.

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No mais, no âmbito do comércio exterior a controvérsia deve persistir uma vez que a Reforma tributária não abrange o imposto de importação, que é baseado na TEC (Tarifa Externa Comum do Mercosul) e depende de negociações para sua modificação. “E ainda, a reclassificação de NCM afeta também controles aduaneiros, sendo relevante a correta classificação para fins regulatórios”, pontua. Com isso, embora a reforma traga simplificação, a correta classificação das mercadorias continua sendo de suma importância para as empresas. Seja no âmbito internacional (assegurando uma correta tributação, evitando multas, determinando controles aduaneiros, assegurando um regime aduaneiro especial), bem como no âmbito local, em que ainda poderá haver benefícios para determinados produtos.

Impacto financeiro para o McDonald’s com a reforma tributária

Giovana Guardia ressaltou ao portal que nos últimos anos algumas discussões referentes a classificações fiscais foram objeto de grande divulgação. São diversos os casos, tanto por divergência de interpretação entre contribuintes e fiscalização ou entre órgãos do próprio governo (como no caso do sabonete Asepxia, em que a RFB entendia ser um item medicinal e a Anvisa como cosmético) ou mudanças de interpretação da própria autoridade fiscal ao longo de anos (ex: item de consumo animal Microvit).

“Entre elas temos a alteração do “Sonho de Valsa” antes classificado como chocolate e, portanto, sujeito a uma alíquota de IPI de 5% (3,25% no último ano) e quando reclassificado para Wafer, ficou isenta de tal imposto”, afirmou. Já no caso do McDonald’s a reclassificação de sorvete para sobremesa láctea representou uma queda de 38,97% para 11,78% dos tributos que incidem sobre tal produto. Há alguns outros casos emblemáticos sobre o tema, como o “leite de rosas” se seria desodorante (7% de IPI) ou loção embelezadora que subiria o tributo para a alíquota de 22% de IPI. Ou da barra de cereal, se seria produtos de confeitaria (à época, incidindo 5% de IPI) ou flocos de cereal (isento de IPI).

Vale lembrar, que a classificação de produtos não é optativa. Deve-se levar em conta a constituição e função de cada produto para classificá-lo com base em suas características próprias. E, com constantes evoluções, o tema possui grande relevância no cenário de tributação nacional e internacional.

Alterações no Preço ao Consumidor

A Tax Manager na Becomex ressaltou que é importante destacar que a Reforma Tributária busca uma neutralidade e com isso, não pretende modificar a arrecadação hoje existente no país, contudo, traz simplificação que a longo prazo tende a diminuir as horas gastas das empresas em cumprimento de obrigações tributárias. “Para tanto, alguns setores serão mais afetados com aumento de tributação, entre eles serviços prestados diretamente ao consumidor e serviços fornecidos por meio digitais, já outros setores serão beneficiados, como a indústria”, enfatizou.

Quanto maior for a cadeia produtiva de determinado produto, há uma tendência de redução no custo final e espera-se que as empresas repassem tais reduções aos consumidores, não simplesmente aumentando sua margem de lucro. Todavia, a transição da Reforma é longa (sendo completada apenas em 2033) e será num primeiro momento. Custoso para as empresas com a convivência de dois regimes tributários distintos. De tal forma que se espera que os benefícios de tal simplificação seja verificado apenas no futuro, não havendo uma perspectiva de redução nos próximos anos.

Casos internacionais de mudança na classificação tributária

Durante a conversa com o N10 notícias, Frey esclareceu que a dificuldade de interpretação sobre a classificação fiscal das mercadorias para fins de tributação não ocorre apenas no Brasil, uma vez que é impossível o legislador, considerando as constantes evoluções tecnológicas e as práticas negociais, fixar um determinado enquadramento a todos os tipos de produtos ou situações para o ordenamento jurídico tributário.

Assim, é possível encontrar disputas relacionadas a classificações fiscais tanto em âmbito local como em âmbito internacional. “Para fins locais, podemos citar, por exemplo, o caso em que o Supremo Tribunal Administrativo de Portugal, órgão similar a nosso CARF, discutiu se a água sanitária misturada com detergente continuaria a ser classificada como água sanitária para fins de tributação (sujeita a 8% de IVA) ou deveria ser enquadrada como componentes gerais de limpeza (sujeito a 17% de IVA), pontuou.

“Podemos falar também, quando se manifestou se o veículo Nissan Terrano II era de passeio ou de carga para fins de aplicação do imposto automóvel (nosso IPVA) e outros exemplos que são verificados sob a tributação sobre imposto de importação a ser aplicado a determinado produto, citamos ainda a título de exemplo na Malásia, a discussão sobre caminhonete cabine dupla e qual classificação a ser aplicada que pode implicar em redução de alíquota de 30% para 10% sobre tal tributo”, finalizou.

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