Bolsonaristas articulam pedido coletivo de impeachment contra Alexandre de Moraes
Senadores bolsonaristas articulam pedido de impeachment contra Alexandre de Moraes após reportagens revelarem que o ministro do STF conduziu investigações extraoficiais com apoio do TSE, levantando acusações de abuso de poder e violação ao devido processo legal.
Senadores bolsonaristas estão se mobilizando para apresentar um pedido coletivo de impeachment contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), em resposta a denúncias de investigações extraoficiais conduzidas pelo magistrado. A articulação é liderada pelo senador Eduardo Girão (Novo-CE), que já iniciou a coleta de assinaturas para formalizar o pedido até o dia 7 de setembro. O documento, que ultrapassa 20 páginas, lista uma série de supostas ilegalidades cometidas por Moraes, conforme revelou reportagem da Folha de S.Paulo.
A motivação central para o pedido de impeachment está nas denúncias de que o gabinete de Moraes teria solicitado, ao menos 20 vezes, a produção informal de relatórios ao setor de combate à desinformação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Esses relatórios, segundo a Folha, foram utilizados para embasar decisões judiciais contra aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro, no âmbito dos inquéritos das fake news e das milícias digitais. A atuação do ministro, que teria ignorado procedimentos formais, configura, segundo os senadores, uma violação ao devido processo legal e ao Estado democrático de direito.
Eduardo Girão, em pronunciamento no Senado, acusou Moraes de violar pelo menos quatro artigos da Lei 1.079, de 1950, que regulamenta o processo de impeachment, incluindo o artigo 2º, que trata da violação de garantias constitucionais, e o artigo 80º, que aborda o crime de prevaricação. Girão também citou a Lei de Abuso de Autoridade (Lei 13.869/2019) e o Código Penal, destacando que as ações de Moraes se enquadrariam como crimes de prevaricação e abuso de autoridade.
O caso de Cleriston Pereira da Cunha, que morreu na penitenciária da Papuda após ter seu pedido de liberdade ignorado, foi apontado por Girão como um exemplo claro da prática de prevaricação por parte de Moraes. Cleriston, que estava preso sob suspeita de envolvimento nos atos de vandalismo de 8 de janeiro de 2023, em Brasília, tinha várias comorbidades e, segundo Girão, deveria ter sido liberado para responder ao processo em liberdade.
Além disso, outros casos de supostos abusos de autoridade foram mencionados, como o de Silvinei Vasques, ex-diretor da Polícia Rodoviária Federal (PRF), que ficou preso preventivamente por um ano, e de Filipe Martins, ex-assessor do governo Bolsonaro, que permaneceu preso por seis meses. Girão afirmou que essas prisões refletem a “ditadura da toga” que, segundo ele, estaria se instalando no Brasil.
Em resposta às acusações, o gabinete de Alexandre de Moraes emitiu uma nota afirmando que todos os procedimentos realizados nos inquéritos das fake news e das milícias digitais foram “oficiais, regulares e devidamente documentados“, com a participação da Procuradoria Geral da República (PGR). A nota defende que os relatórios produzidos pelo TSE simplesmente descreviam as postagens ilícitas realizadas nas redes sociais e que foram utilizados como parte das investigações em curso.
Os senadores bolsonaristas também protocolaram requerimentos na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado para convocar Airton Vieira, juiz instrutor do gabinete de Moraes, e Eduardo Tagliaferro, ex-chefe de assessoria do TSE, para prestar esclarecimentos sobre as mensagens reveladas pela Folha de S.Paulo.
Mensagens trocadas
A reportagem exclusiva da Folha de S.Paulo, publicada em 13 de agosto de 2024, trouxe à tona uma série de mensagens e arquivos trocados via WhatsApp entre o ministro Alexandre de Moraes, seu principal assessor no STF, Airton Vieira, e Eduardo Tagliaferro, então chefe da Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação (AEED) do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Segundo a Folha, o material obtido, que ocupa mais de seis gigabytes de dados, não foi fruto de interceptação ilegal ou acesso hacker, mas sim de fontes com acesso legal a um telefone que continha as mensagens.
O conteúdo das mensagens revela que o gabinete de Moraes solicitou informalmente a produção de relatórios ao setor de combate à desinformação do TSE em pelo menos 20 ocasiões. Esses relatórios foram utilizados como base para embasar decisões do STF contra aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro, como parte dos inquéritos das fake news e das milícias digitais. A reportagem destaca que essa prática ocorreu durante e após as eleições de 2022, evidenciando uma cooperação entre o STF e o TSE fora dos canais formais e regimentais.
Em um dos trechos das mensagens divulgadas pela Folha, Airton Vieira expressa preocupação sobre a possibilidade de que o uso do TSE para produzir esses relatórios fosse descoberto. Em um áudio enviado a Tagliaferro, Vieira afirmou que “se alguém for questionar, vai ficar uma coisa muito descarada“. Em outro momento, ele orienta que os relatórios, mesmo que solicitados por Moraes, fossem formalmente atribuídos ao TSE para evitar possíveis questionamentos futuros.
A reportagem da Folha também destaca o caso de dois apoiadores de Bolsonaro, Rodrigo Constantino e Paulo Figueiredo Filho, que foram alvos das medidas baseadas nos relatórios produzidos a partir dessas solicitações informais. As ações determinadas por Moraes incluíram a quebra de sigilo bancário, o cancelamento de passaportes, o bloqueio de redes sociais e intimações para depoimento na Polícia Federal.
A revelação dessas práticas levantou sérias preocupações entre os senadores bolsonaristas, que veem na atuação de Moraes um abuso de poder e uma violação ao devido processo legal. A Folha de S.Paulo ainda relatou que em algumas das conversas, os assessores de Moraes manifestaram receio de que as provas obtidas por meio dessas solicitações informais pudessem ser questionadas por conta da forma como foram obtidas.