O Comitê de Política Monetária (Copom) se reúne nesta quarta-feira (11) para anunciar sua decisão sobre a taxa Selic. A reunião marca o fim da gestão de Roberto Campos Neto à frente do Banco Central (BC), que deixará o cargo em 31 de dezembro após quase seis anos.
Nomeado em fevereiro de 2019 pelo então presidente Jair Bolsonaro, Campos Neto deixa um legado marcado pela presidência do primeiro BC autônomo do país, pelo combate à inflação pós-pandemia e por uma notória presença no cenário político.
Segundo Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados, “O Banco Central foi bem sucedido em trazer a inflação de volta à normalidade após a pandemia. Por outro lado, os últimos dois anos, por conta da diferença política com o presidente Lula, foram de divergências políticas afloradas”.
Sua gestão também foi responsável pelo lançamento do Pix em 2020, sistema que rapidamente se tornou uma das principais formas de pagamento no Brasil. Outras inovações como Pix parcelado, automático e por aproximação também foram implementadas durante este período.
Em termos de juros e inflação, Campos Neto assumiu o BC com uma inflação acumulada em 12 meses de 3,89% (IBGE) e a Selic em 6,50% ao ano. Nos dois primeiros anos, a taxa básica de juros caiu para 2% ao ano, permanecendo neste nível entre agosto de 2020 e março de 2021.
O desafio, conforme Vale, surgiu com a pandemia. Entre 2021 e 2022, o IPCA acumulado em 12 meses atingiu 12,13% em abril de 2022, impulsionado pela Covid-19, políticas de enfrentamento à crise sanitária e conflitos internacionais, como a invasão da Ucrânia pela Rússia. Em resposta, o Brasil elevou rapidamente a Selic, que passou de 2% em 2021 para 13,75% em agosto de 2022. A inflação, contudo, voltou a se enquadrar na meta em 2023, fato destacado por Vale como um sucesso da gestão: “Ele foi bem sucedido pelos números em si. É uma inflação que chegou a 12% e no ano passado ficou abaixo do teto da meta. Nós conseguimos desinflacionar a economia, e o que é mais difícil, conseguimos sem provocar uma recessão. É um cenário de sucesso”.
A autonomia do Banco Central, sancionada em 2021, permitiu a Campos Neto tomar decisões independentemente da influência política do governo. Vale observa que a autonomia é um processo de adaptação, pontuando a possibilidade de “politização” inicial devido à tendência de escolha de nomes próximos ao poder. “Talvez você tenha aumentado a politização do comitê, com um incentivo para que o presidente escolha alguém muito próximo”, afirma Vale, embora veja a combinação de mandatos e alternância de poder como um fator positivo para a pluralidade do Copom: “O BC vai ter um pouco mais de arejamento, de discussão, de debate”.
A atuação de Campos Neto no cenário político foi marcada por divergências com o presidente Lula, mas também por atitudes próprias, como o voto nas eleições de 2022 com uma camisa da seleção brasileira, interpretado por muitos como apoio a Bolsonaro. Em entrevista ao programa “Conversa com Bial”, Campos Neto declarou: “Era uma coisa mais do mundo privado do que do mundo público. Obviamente, hoje, pensando, eu não teria feito isso, né? Pensando em hoje”. Lula, por sua vez, criticou repetidamente os juros altos. Campos Neto, em julho de 2023, defendeu seu trabalho, afirmando que o pico da taxa de juros ocorreu durante a campanha de reeleição de Bolsonaro. Vale ressalta os prejuízos dos ruídos políticos para o BC: “Os ruídos causados pelas falas, discursos e debates mais atrapalham do que ajudam”.
Com o fim iminente da gestão Campos Neto, a atenção se volta para seu sucessor, Gabriel Galípolo, e os três novos diretores do BC indicados pelo governo Lula. A expectativa é pela continuidade do aumento dos juros, com projeções da Selic em 13,50% ao ano para 2025, segundo o boletim Focus, embora haja previsões mais altas. O comportamento de Galípolo frente a possíveis pressões políticas será um ponto crucial, segundo Vale: “Eu imagino que o Galípolo vai seguir esse perfil do Campos Neto e se manter próximo da política. Mas estamos nesse caminho da retomada da alta dos juros e isso vai ser um teste. Não vejo como ele não precise levar os juros para 14% ou 15%”.
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