Respeitar o ritmo de aprendizado de cada aluno vai além de atender suas dificuldades com o conteúdo, mas passa por entender suas necessidades de sono, alimentação e sua vontade para fazer exercícios e brincar. Quem defende a tese é o neurocientista Sidarta Ribeiro, diretor do Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
Atraído pela educação após voltar há 10 anos dos Estados Unidos, onde obteve Ph.D. em comportamento animal pela Universidade Rockfeller e pós-doutorado na Universidade de Duke, Sidarta começou a fazer experimentos usando o sono como ferramenta de aprendizado escolar. A ligação entre a sua especialidade e a forma com que se adquire conhecimento, segundo ele, estão dadas desde a metade do século passado, quando o psicólogo canadense Donald Hebb escreveu que “aprendizado está se tornando cada vez mais necessário para entender o problema dos adultos na sociedade”.
Brincadeiras e exercícios físicos
Para Sidarta, o exercício físico é tratado pela escola, com um certo desprezo. É visto como uma aula complementar e é a primeira ser descartada em caso de uma mudança na programação do dia na escola.
No entanto, pesquisas tanto em animais quanto em seres humanos mostram que exercícios criam uma melhor condição para o aprendizado. “O que descobriram foi um aumento durante o tempo no volume do hipocampo [principal sede da memória], mas não no cérebro todo. Ainda que o exercício não lide com nada relacionado à memória declarativa [de longo prazo], pode ter uma influência forte na habilidade para sua aquisição e manutenção”, detalha.
Sidarta lembrou ainda que há espaço muito grande para pesquisas na área, e não apenas a memória declarativa, mas a procedural (de procedimentos, hábitos e habilidades) pode trazer novidades. “Um trabalho na Argentina mostrou que só mudando alunos de uma sala para outra já é possível melhorar o aprendizado. O argumento é que a escola não faz isso de maneira sistemática”.
Alimentação
É de conhecimento geral que uma alimentação regrada é essencial para o bem-estar. Qual a evidência disso? Sidarta explica que o cérebro precisa de muita glicose para trabalhar e isso não se trata de um efeito placebo em que há uma recompensa porque algo doce foi colocado na língua. O excesso de gordura, no entanto, além de trazer os já conhecidos riscos à saúde, torna a retenção de conteúdo mais lenta.
Sidarta defende que a escola, da mesma maneira com que deve proceder com os exercícios físicos, deve fazer um esforço para correlacionar os momentos de alimentação ao currículo. “Não há uma tentativa na maior parte das escolas de dizer: Muito bem, você se saiu bem e por causa disso pode comer. Eu não digo que crianças que não se saíram bem podem passar fome, mas deve-se usar de maneira mais inteligente esses componentes metacognitivos”. Ao aprender no momento correto e comer o alimento certo, a criança aprende melhor. “Esse é o tipo de conversa que não existe na escola com a criança. Elas ganhariam muito porque entenderiam melhor por que estão ali. A maioria não entende e acha que está só gastando tempo”.
Sono
Sidarta trata por último do sono, que é dividido em duas grandes fases: a inicial e o REM (sigla em inglês para fase de movimento rápido dos olhos), que acontece na segunda fase da noite. “Algumas pessoas acreditam que o sono inicial é bom para o aprendizado declarativo, enquanto outras, para procedimentos. Não há um consenso nesse campo, mas é aceito que as duas fases são importantes para o aprendizado”.
Sidarta admite, no entanto, que é difícil negociar a ideia de inserir longos períodos de sono no dia a dia escolar dado o formato conteudista que domina. “Se tiver uma pequena soneca, de 10 ou 30 minutos, é mais fácil encaixar dentro da programação”.
Até agora, segundo ele, os estudos mostram que o sono impacta mais com o tempo de retenção do conhecimento do que com o “aprender mais”. “Quando falo em melhora de 10% para professores e diretores, eles dizem que é muito pouco. Por que vou cancelar minha aula para deixá-los dormir se eles vão aprender só 10% mais? É claro que não sei a resposta para isso, mas suspeito que nós estamos lidando a situações semelhantes ao do interesse composto. Ter 10% todo dia pode terminar sendo muito após seis meses ou um ano”.
Escola dos sonhos
O neurocientista defende que o ambiente escolar ideal deve privilegiar a autonomia do aluno e isso deve passar primeiro por suas necessidades fisiológicas. E enumera possíveis situações com as quais educadores teriam de lidar: “O que você quer fazer? Quer jogar capoeira agora? Então tudo bem. Quer comer? Tudo bem. Se quiser dormir, vai dormir. Está feliz? Sim. Então agora podemos aprender, agora podemos ter uma aula.”
Ele defende um formato de aula mais curto para que todos se envolvam. Em um mundo ideal, Sidarta vê a neurociência estudando não só a curva média de desempenho da turma, mas o que acontece com o aprendizado de cada indivíduo. Assim, explica, será mais fácil identificar os momentos onde se aprendeu mais e dizer quando o aluno pode comer ou pode dormir mais um pouco para consolidar esse aprendizado. No futuro, temos que investir mais na autorregulamentação. Você não diz aos alunos quando eles precisam ir ao banheiro. Eles já fazem isso. Por que não deixar também que digam quando querem dormir ou comer? Temos que ouvir mais crianças.
Com informações da EBC
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