O comércio varejista do Rio Grande do Norte teve uma queda histórica no mês de março deste ano, segundo dados do Índice de Atividade Econômica Stone Varejo, que apresenta dados mensais de movimentação no setor. De acordo com o levantamento, a queda foi de 11,3% em relação a março de 2022.
O índice leva em consideração as vendas no comércio em operações de crédito e débito. Para interlocutores do segmento varejista do RN, os ataques criminosos influenciaram negativamente na arrecadação e faturamento de lojistas.
Entre os estados do Nordeste, apenas Piauí, Paraíba e Ceará apresentaram variações positivas em março. “Imagino que esses ataques não tenham impactado só o varejo, mas o turismo e setor de serviços. Não é possível afirmar se todo o efeito foi por conta disso [ataques], mas influencia sim”, analisa o pesquisador econômico e cientista de dados da Stone, Matheus Calvelli.
Ele aponta também outros fatores que podem ter contribuído para o resultado negativo, como o comportamento dos turistas que, no início do ano passado, com a volta ao normal da pandemia, optaram mais por destinos nacionais. “O dólar estava caro. É natural que o Sudeste viaje para o Nordeste. Então, quando comparamos março do ano passado com esse ano, tínhamos mais gente viajando no ano passado. Era um período de elevação. Isso pode ter sido um fator também”, pontua.
Em nível de Brasil, no mês de março de 2023, as vendas no varejo caíram 1,8%, em relação ao mesmo período de 2022. De acordo com o levantamento, apenas dois setores registraram crescimento no terceiro mês do ano: artigos farmacêuticos (10%) e móveis e eletrodomésticos (1,8%). Cinco segmentos não conseguiram alcançar resultados positivos, com a maior queda no sub-segmento de hipermercados e supermercados (-10,3%), seguido por livros, jornais, revistas e papelaria (-9,2%), tecidos, vestuários e calçados (-4,1%), hipermercados, supermercados, produtos alimentícios, bebidas e fumo (-1,4%) e material de construção (-1,2%).
“Basicamente, não existem feriados nacionais em março e, historicamente, isso tem influência no comércio de modo geral”, explica Calvelli. “O nosso indicador econômico traz uma visão completa a respeito do varejo no país e isso ajuda o empreendedor a entender o mercado nacional, com os movimentos setoriais e as oscilações dos segmentos examinados”, complementa o pesquisador econômico e cientista de dados da Stone, responsável pelo levantamento.
O presidente da Associação dos Empresários do Bairro do Alecrim, Matheus Feitosa (Aeba), diz que as empresas de pequeno, médio e grande porte tiveram redução de vendas na casa dos 70%, mesmo para marcas que atendem de forma virtual. Feitosa aponta, ainda, que os ataques criminosos em março influenciaram na feira do bairro e reduziram conseqüentemente o fluxo de pessoas no Alecrim. Oficialmente foram 307 ocorrências em mais de 40 cidades entre os dias 14 e 24 de março.
“Os depoimentos dos lojistas é que até o dia 10 de março, as empresas vinham em um bom ritmo de vendas, tanto presencialmente quanto virtualmente. Após os ataques, se espalhando nos grupos e entre clientes e empresários, as vendas começaram a cair e se estagnaram por volta de 70% a 80% em perda de vendas e fluxo de clientes até esse movimento cessar”, aponta.
Lojistas da Cidade Alta também corroboraram a queda no faturamento durante no mês passado. “Esperávamos um mês bom, mas infelizmente com esses ataques houve uma queda e demorou muito para se resolver o problema. Era um verdadeiro terror. As fake news também atrapalharam, fechávamos a loja e ficávamos aqui dentro”, comenta o vendedor de artigos para celular, Leonardo Macedo, 25 anos.
Notícias de arrastões, que não se confirmaram, afastaram clientes e comprometeram as vendas. “Passamos a trabalhar até 13h, isso trouxe um prejuízo grande para o comércio do Centro. Tivemos que fechar a galeria em alguns momentos. A queda no geral foi de 50% no movimento e faturamento”, acrescenta o barbeiro Daniel Dantas, 46.
Crise afetou quase metade do mês no comércio do RN
Para a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Rio Grande do Norte- Fecomércio/RN, o indicador Stone de Varejo Restrito é o primeiro sinal concreto de algo que o setor já esperava: a queda vertiginosa nas vendas do Comércio e dos Serviços no mês de março em. “O índice de -11,4% sobre março do ano passado, a maior retração do Brasil, deixa muito claro que houve uma fortíssima influência negativa da crise de segurança, que comprometeu quase 50% dos dias do terceiro mês do ano, no faturamento das empresas”, relata o presidente da entidade, Marcelo Queiroz.
Segundo ele, esta visão fica mais nítida quando se compara o índice potiguar com o dado nacional (queda de 1,8%) e, principalmente, com os dados de estados vizinhos como Ceará (+0,8%) e Paraíba (+1,3%). “Aliás, podemos até dizer que parte das vendas que perdemos podem ter migrado para estes estados, exatamente aquela parte dos turistas que deixamos de receber aqui e que terminaram optando pelos nossos vizinhos, onde havia segurança”, avalia Queiroz.
Marcelo Queiroz, da Fecomércio, pondera que o índice Stone é particularizado apenas em uma operadora de vendas e, por isso, não é definitivo. “Mas é um bom balizador. Iremos acompanhar com muita atenção os dados da arrecadação estadual relativos a março que, esperamos, também devem ser publicados até a semana”, declara.
Na visão dele, o índice é preocupante, especialmente quando se considera que em alguns segmentos (como o do Turismo, por exemplo) os reflexos de todo o caos enfrentado pelo estado nos dias de ataques ainda ecoam.
Dados da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH-RN) apontam, por exemplo, que a ocupação média durante a semana santa deste ano ficou em 52% (em 2022, a ocupação foi de 65%). Já no comparativo com o ano de 2019, antes da pandemia de covid-19, o recuo foi ainda maior, de 18 pontos percentuais, uma vez que a ocupação dos hotéis do RN naquele ano ficou em 70%.
“Os atos terroristas e atentados afugentaram os turistas e viajantes. O reflexo está acontecendo agora, exatamente como nós prevíamos. O nosso medo não era de imediato, nossa preocupação sempre foi com as vendas futuras. Como elas estarão?”, questionou Abdon Gosson, presidente da ABIH-RN durante audiência pública na terça-feira (11) na Assembleia Legislativa do Estado, quando se discutiu a crise no setor.
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