“Na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”, para 86 detentos das penitenciárias estaduais de Alcaçuz, Parnamirim e na Federal de Mossoró, a célebre frase do químico francês Antoine Lavoisier nunca fez tanto sentido.
Ao longo dos últimos três meses os apenados iniciaram um processo de transformação através da participação em cursos de capacitação profissionalizante ofertados pela Escola Agrícola de Jundiaí, Unidade Acadêmica Especializada em Ciências Agrárias da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), através do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec).
Para Natália, 23 anos, presa há 2 por tráfico de drogas, o curso é uma oportunidade de mudar de vida. “Sofremos muito com a prisão e nossos familiares também. Devido à falta de condições minha família nunca veio me visitar, e o único apoio que tenho para superar as dificuldades, vem das minhas companheiras de cela. Com este curso estou no caminho certo para retomar a minha vida e ficar longe do crime”, acredita.
“A UFRN tem como missão contribuir para o desenvolvimento humano e a justiça social. Através da Escola Agrícola de Jundiaí, a Universidade tem chegado às áreas mais remotas do RN oferecendo uma oportunidade única de inclusão social e profissionalização aos beneficiários do Pronatec”, é o que afirma o diretor da Escola Agrícola de Jundiaí, professor Júlio César de Andrade Neto.
Cidadania
Criado em 2013, o Pronatec Presídios é uma iniciativa que busca promover a ressocialização de detentos. Esta oferta exclusiva já beneficiou mais de 25 mil apenados em todo o Brasil. Entre os cursos ofertados, os mais buscados são da área de infraestrutura, como pedreiro e carpinteiro. No RN, a Escola Agrícola de Jundiaí oferta cursos de Assistente Administrativo, Auxiliar de Biblioteca, Auxiliar de Recursos Humanos e Eletricista Instalador Predial de Baixa Tensão.
Para participar do Pronatec Presídios, é necessário que a previsão de progressão da pena (de fechado para semiaberto, por exemplo) seja superior à duração do curso. A cada 12 horas estudadas os participantes tem pena reduzida em um dia.
Segundo o subsecretário de Justiça e Cidadania (Sejuc), coronel Francisco de Assis Castro, é uma satisfação oportunizar a capacitação profissional aos apenados do Rio Grande do Norte. “Nós vemos esta oferta de cursos profissionalizantes como uma forma de promover a valorização do ser humano. Esta formação profissional dá às pessoas privadas de liberdade perspectivas de mudança de vida, e pode diminuir a reincidência criminal”, avalia.
“Tudo o que vier para somar e melhorar a autoestima dessas pessoas será bem vindo e apoiado pela Sejuc. Estamos satisfeitos com os resultados atingidos nos cursos que foram ofertados em parceria com a Escola Agrícola de Jundiaí/UFRN. É visível a transformação no semblante dos participantes o quanto o curso mudou suas vidas”, completa o coronel Francisco de Assis Castro.
Calamidade no sistema prisional
No RN, o sistema prisional está em estado de calamidade desde a publicação do decreto em março de 2015. Segundo dados da Secretaria de Justiça e Cidadania (Sejuc), um dos principais problemas enfrentados é a superlotação das unidades. Atualmente, o Rio Grande do Norte possui 3.500 vagas para uma população carcerária de 7.500 detentos.
De acordo com a pasta, nos próximos meses serão implantadas medidas para contornar a crise no sistema como a aquisição de equipamentos para revista e monitoramento eletrônico dos presos, além de aquisição de armas, ampliação da frota e construção de novas unidades.
Uma das medidas importantes para contornar a crise no sistema prisional é a ampliação dos projetos de educação e capacitação profissional, estabelecidos pela Lei de Execução Penal n° 7.210 de 1984 (LEP), conforme explica a Diretora da Escola Penitenciária do RN, Clécida Simone do Rêgo.
“Ao inserirmos os apenados em projetos de educação e capacitação profissional, conseguimos provocar mudanças no seu comportamento dentro da prisão”, explica. “A oferta de cursos profissionalizantes nas unidades prisionais é uma excelente proposta para o reingresso social do apenado em consonância com a dignidade humana, conforme estabelece a Lei de Execução Penal”, afirma. “Para tanto, a Sejuc tem trabalhado na reestruturação do Núcleo de Reintegração Social desenvolvendo ações e elaborando projetos para que se ampliem os trabalhos e a rede de pactuação seja bem extensa para alcançar o maior número de apenados”, complementa.
Certificação
No Presídio Agrícola Mário Negócio em Mossoró e no Centro de Detenção Provisória (CDP) Feminino de Parnamirim, 34 apenados receberam no fim de abril os certificados de conclusão dos cursos de Auxiliar de Biblioteca, Auxiliar de Recursos Humanos e Eletricista Instalador Predial de Baixa Tensão.
Wagner Tavares, um dos concluintes do curso de Auxiliar de Biblioteca no Presídio Agrícola Mário Negócio, destaca que a certificação representa o início de uma mudança de vida. “Nunca tive oportunidade de estudar, e com este curso agora tenho uma profissão de respeito para conseguir retomar a minha vida longe do crime”, diz.
Para Luianeide Ribeiro, uma das concluintes do curso de Eletricista Instalador Predial de Baixa Tensão no Centro de Detenção Provisória (CDP) Feminino de Parnamirim, a conquista de um certificado de formação profissional é o único ponto positivo no período de reclusão. “Mesmo estando longe de nossas famílias e estando privada de liberdade, conquistar este certificado é muito positivo e representa um recomeço que com certeza vai mudar a minha vida e de todas as outras que fizeram o curso”, fala.
Cecília Oliveira / Agecom-UFRN
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