Os familiares de uma menina que morreu em uma operação policial realizada durante um assalto no Município de Parnamirim ganharam uma ação indenizatória por danos morais e materiais contra o Estado do Rio Grande do Norte e vão receber R$ 170 mil, a título de danos morais, cada um (pais e irmãos da vítima), totalizando R$ 510 mil.
O pleito indenizatório teve por fundamento o óbito da filha e irmã dos autores que ocorreu no ano de 2008 e a sentença condenatória foi proferida pelo Grupo de Apoio às Metas 2, 4 e 6 do Conselho Nacional de Justiça, em atuação perante o Juízo de Direito da Vara da Fazenda Pública de Parnamirim.
O Grupo também condenou o Estado a pagar aos autores pensão mensal correspondente ao valor de 2/3 do salário-mínimo, a ser repartido entre o pai e a mãe da vítima, até a data que a vítima completaria 25 anos, seguindo-se após esta data o valor de 1/3 do salário-mínimo, até a data em que a vítima completaria 65 anos.
O caso
Na ação, os familiares da garota narraram que no dia 04 de maio de 2008, a menor saiu com sua avó para comprar água em um mercado próximo à sua residência, momento que três assaltantes abordaram. Alegaram que um dos assaltantes, após abordagem, fugiu do local levando a menor, sendo perseguido por policiais. Afirmaram que após troca de tiros, tanto o suspeito quanto a menor morreram, demonstrando, segundo os autores, ação desastrosa da Polícia Militar do RN.
O Estado tentou, na mesma ação, levar à Justiça a responsabilização dos policiais envolvidos na ação, mas o Juízo não vislumbrou a necessidade imediata de tal medida, esclarecendo que o Estado pode exercer o seu direito ao regresso de forma autônoma, como prevê o parágrafo primeiro do artigo 125 do Código de Processo Civil.
Ao examinar os documentos e depoimentos das testemunhas constantes do processo, o Grupo de julgamentos constatou que, na verdade, houve perseguição de policiais aos bandidos e troca de tiros entre eles, não se sabendo, ao certo, no primeiro momento, se o tiro que atingiu o autor veio de armas de policiais ou do assaltante.
Neste cenário, entendeu que os autores têm razão, já que a jurisprudência é pacífica, inclusive no STJ, no sentido de que, nestes casos, a responsabilidade do Estado é objetiva e o nexo de causalidade está no fato de que o Estado, nos casos de perseguição policial com troca de tiros em via pública, cria uma situação de risco (comportamento danoso).
Tal comportamento criado – continua – se relaciona diretamente com o dano causado a terceiros inocentes atingidos por balas perdidas advindas deste evento, ainda que não se tenha certeza se o tiro que atingiu a vítima tenha saído de armas de policiais ou bandidos, posto que o Estado, na verdade, incrementou uma situação de risco.
“O Estado-réu não pode invocar a possível licitude da conduta de seus agentes, baseando-se, principalmente, no dever de combate à criminalidade, para se desobrigar de qualquer indenização. Não se trata de um salvo-conduto para o poder público”, comentou.
Nexo de causalidade
Para a equipe de juízes, se a conduta do agente do Estado engendrou de forma direta ou indireta ou concorrente o resultado danoso e injusto a terceiro inocente, como no fato – espécie de bala perdida, a conduta ativa dos agentes policiais na troca de tiros com bandidos evidencia neste próprio fato o nexo de causalidade necessário à imposição da responsabilidade civil objetiva do Estado.
“Os fatos narrados implicaram em sérios sofrimentos aptos a abalar não só o psicológico dos autores, como também de toda família, pessoas pobres e humildes, vítimas da desigualdade em nosso País, bem como a sua honorabilidade, gerando inafastável dever de indenizar, máxime porque a Carta Federal garante a proteção familiar da dignidade humana (art. 1º, III da CRFB/88)”, assinalou.
Ao concluir, a decisão assinalou que, ainda que se sustente que a ação policial foi lícita, esta veio a causar dano ao autor ao criar ou incrementar uma situação de risco em via pública em perseguição policial a assaltantes, com troca de disparos, vindo a vitimar a menor, terceiro inocente, posto que, no ordenamento jurídico do país, o ato lícito causador de dano também pode ensejar reparação. “Portanto, o dano material e moral sofrido pelo autor, nestas hipóteses, é indenizável”, concluiu.
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