O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, reconheceu a influência de seu discurso na escalada da violência policial no estado. Em evento no Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), ele afirmou que *“Os erros que a gente comete têm reflexo. E tem hora que a gente tem que parar para pensar, fazer uma profunda reflexão e ver onde é que nós estamos errando. Por que é que nós estamos errando? Onde é que nós erramos no discurso? E aí eu concordo com a professora Joana, o nosso discurso tem peso. E, às vezes, se a gente erra no discurso, a gente dá o direcionamento errado e a gente traz consequências erradas. E isso é fácil de ser percebido, hoje”*. Essa declaração surge em meio a um aumento significativo de denúncias de abuso de autoridade e homicídios cometidos por policiais paulistas, muitos deles registrados em vídeo.
A declaração do governador foi feita em resposta a comentários da professora Joana Monteiro, coordenadora do Centro de Ciência Aplicada à Segurança Pública da Fundação Getúlio Vargas (FGV). A professora alertou para o impacto da retórica das autoridades sobre a atuação policial, afirmando que *“O que os senhores falam importa muito, absurdamente. A mensagem que vocês passam para as pessoas e para a tropa tem um efeito, às vezes, muito maior do que qualquer aparelho tecnológico. O policial da ponta é talvez os que mais sofrem com isso. E discursos populistas de que pode-se usar a força unicamente, quem mais sofre com isso é o policial na ponta, porque ele vai cair e quem vai ser responsabilizado criminalmente depois é ele. É a vida dele que vai acabar se isso acontece”*.
Tarcísio admitiu não ter respostas sobre como equilibrar seu discurso, evitando a interpretação de que estaria dando um “salvo-conduto” aos policiais, ao mesmo tempo em que garante o cumprimento das normas de segurança. Ele questionou: *“Como modular o discurso para garantir, de fato, segurança jurídica, mas também o atendimento às normas, o atendimento aos procedimentos operacionais? Como não permitir o descontrole? Como deixar claro que não existe salvo-conduto? Então, observem que eu tenho, no final das contas, uma série de dúvidas. Não tenho respostas”*.
Essa postura contrasta com declarações anteriores. Em março, ao ser questionado sobre o aumento da violência policial na Baixada Santista, no contexto da Operação Verão da Polícia Militar, Tarcísio declarou: *“Sinceramente, nós temos muita tranquilidade com o que está sendo feito. E aí o pessoal pode ir na ONU, pode ir na Liga da Justiça, no raio que o parta, que eu não tô nem aí”*. Na ocasião, o número de mortes causadas por policiais em serviço na região havia crescido mais de cinco vezes nos dois primeiros meses do ano.
O governador também expressou arrependimento em relação à sua posição inicial contrária ao uso de câmeras corporais por policiais. Ele afirmou: *“A política de câmeras é uma política que eu particularmente me arrependo muito da postura reativa que eu tive lá atrás. Essa postura vem da percepção que aquilo poderia tirar a segurança jurídica do agente ou mesmo causar hesitação no momento em que ele precisava atuar. E hoje eu percebo que eu estava enganado. Hoje eu percebo que ela ajuda o agente da segurança pública, eu percebo que ela é um fator de contenção e nós precisamos sim de contenção”*. Vale ressaltar que pesquisas, como a do Unicef e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), divulgada em maio de 2023, apontaram uma queda de 62,7% na letalidade policial em São Paulo após a adoção das câmeras corporais, passando de 697 mortes em 2019 para 260 em 2022.
Quer receber as principais notícias do Portal N10 no seu WhatsApp? Clique aqui e entre no nosso canal oficial.