Uma pesquisa recente revelou que a maioria das servidoras públicas federais em cargos de chefia enfrenta barreiras significativas em suas carreiras devido ao sexismo e ao machismo. O estudo, intitulado “Mulheres em cargos de liderança no Executivo federal: reconhecendo desafios e identificando caminhos para igualdade”, entrevistou 70 mulheres em posições de liderança na esfera federal.
Conduzido pela pesquisadora Michelle Fernandez da Universidade de Brasília (UnB), a pedido do Movimento Pessoas à Frente, o estudo detalha os principais obstáculos enfrentados por essas mulheres. Um dado alarmante: 60% das entrevistadas acreditam que o sexismo e a estrutura machista impedem sua progressão profissional.
Entre os desafios mais destacados, 45,7% apontaram o desrespeito e o assédio moral como fatores que dificultam a ascensão na carreira. A dificuldade de conciliar a vida profissional com as responsabilidades de cuidado e maternidade foi relatada por 71,4% das participantes. A diretora executiva do Movimento Pessoas à Frente, Jessika Moreira, destaca em nota: “O que as pesquisas têm mostrado é que a presença de mulheres em cargos de liderança diminui na medida em que o nível hierárquico aumenta. Nesse estudo, percebemos que o desafio mais citado é o de não possuírem o direito de errar”.
Jessika complementa: “Além disso, todas as mulheres, inclusive aquelas que não são mães, reconhecem o impacto da maternidade e do trabalho do cuidado enquanto dimensões que as desqualificam diante de seus pares no poder e as colocam como impossibilitadas de ocupar cargos de chefia, funções nas quais supostamente deveriam estar integralmente disponíveis para o trabalho”.
Outro dado preocupante é a cobrança excessiva e a expectativa de excelência, relatadas por 72,8% das entrevistadas. As relações interpessoais e indicações privilegiando homens foram apontadas como entrave por 48,5% das participantes. Jessika ressalta a necessidade de mudança: “As mulheres, especialmente as negras, relatam que precisam ser infinitamente melhores do que os homens para ocupar as mesmas posições. Tudo isso em um ambiente onde, como mostra a pesquisa, elas precisam conviver com desrespeito e assédio moral diariamente”.
Apesar dos desafios, a pesquisa também identificou fatores que contribuem para a ascensão profissional das mulheres. O acúmulo de conhecimento técnico e a produtividade foram citados por 66 das 70 entrevistadas, enquanto a rede de relações interpessoais foi mencionada por 60. Michelle Fernandez, coordenadora da pesquisa e professora da UnB, destaca que esses fatores se tornam aliados fundamentais para a ascensão, mesmo diante dos obstáculos.
O estudo também analisou estratégias para promover a igualdade de gênero. A implementação de políticas afirmativas, com reserva de metade dos cargos para mulheres, foi sugerida por 51,4% das entrevistadas. A oferta de capacitação e treinamento voltado para lideranças e mentorias entre mulheres foram outras sugestões (42,8%), assim como a institucionalização de políticas de cuidado para incluir mães e gestantes (28,5%).
O Movimento Pessoas à Frente destaca a preocupante posição do Brasil: o último lugar (15º) no ranking de participação feminina em cargos de liderança na América Latina, segundo estudo do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) de 2022.
Dados do Observatório de Pessoal do Governo Federal (2023) mostram que, embora as mulheres representem a maioria da população, elas ocupam apenas 42% dos cargos de chefia no Executivo federal. Em funções especiais (secretarias executivas e subchefias), a presença feminina cai para 27%, contra 73% de homens. A situação é ainda mais crítica para mulheres negras, que ocupam apenas 8% dessas funções. Jessika finaliza: “Precisamos de um funcionalismo que espelhe verdadeiramente as características de nossa população, para que as decisões sejam tomadas de acordo com as reais necessidades dos cidadãos e cidadãs”.
Para abordar a problemática, o Movimento Pessoas à Frente criou o Grupo de Trabalho Mulheres no Serviço Público, que produziu o documento “Mulheres no Serviço Público – recomendações para acesso, ascensão e permanência”, disponível em este link. O documento foi lançado durante o Congresso Internacional do CLAD, em Brasília.
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